O filósofo Heráclito de Éfeso dizia que “O caminho para cima e o caminho para baixo são os mesmos”. Indicava assim que a natureza do percurso existencial pode ser o mesmo, mas o que faz a diferença é a forma como cada indivíduo passa e acumula as suas experiências.

A trajetória artística da artista plástica Suely Cauduro segue um parâmetro semelhante. Seu diferencial estético está na forma como olha o mundo e como retira dele as mais variadas impressões poéticas. O trabalho que desenvolve, portanto, baseado em constante pesquisa, apresenta sempre surpresas e uma constante inquietação criativa.

Nascida em São Paulo, Capital, em 12 de março de 1939, Suely cursou professorado em Desenho Pedagógico e Geral na Casa São Vicente de Paula e obteve seu bacharelado em Artes Plásticas, com especialização em gravura, na Faculdade Santa Marcelina (FASM), em 1986, realizando posteriormente uma pós-graduação lato sensu em Arte Terapia na Unifran.

A primeira exposição da artista foi justamente em 1986, ao terminar a graduação, quando apresentou aquarelas e gravuras, sendo que estas últimas foram o resultado da pesquisa desenvolvida sob orientação de Iole Di Natale, uma das maiores especialistas do País na técnica. Para se aperfeiçoar, realizou, no ano seguinte, curso de Técnicas Experimentais de Gravura na Scuola Internazionale Di Gráfica em Veneza.

Devido a uma alergia temporária, aos ácidos usados na calcogravura (gravura com matriz em metal), Suely começou a se dedicar progressivamente à aquarela, tendo inclusive participado, ainda em 1987, da Fundação do Núcleo de Aquarelistas da FASM. Isso fez com que seu trabalho seja, por muitos, mais identificado com a aquarela, embora ela também transite com sucesso por outras formas de expressão.

A estética de Suely, carregada de uma expressividade muito própria, é o resultado de um processo contínuo, que inclui visitas a museus e exposições de arte, além de muita leitura. A participação em diversas aulas e workshops levou-a a uma natural paixão pelo trabalho de mestres da arte – e mais especificamente da aquarela – como Dürer, Turner e Nolde.

Mas isso não impede que avalie como fundamentais em sua carreira o contato com artistas contemporâneos como Guyer Salles, Ubirajara Ribeiro, Evandro Campos Jardim, Sergio Fingerman, Flavio Shiró, Susan Rothemberg., Renina Katz e Faiga Ostrower, além de ter freqüentado cursos de gravura e aquarela em diversas instituições, tanto no Museu de Arte Moderna (Mam) de São Paulo como em Veneza e Nova York.

O resultado desse esforço contínuo pelo domínio de variadas técnicas que lhe permitem expor melhor o próprio talento pode ser visto, por exemplo, na sua participação como aquarelista na coletiva “Brasil Água, Acqua Venezia”, apresentada ao público, em 2000, na Itália, e, em 2002, na Pinacoteca do Estado de São Paulo, assim como gravuras no Museu de Arte de São Paulo (Masp) e Museu de Arte Contemporânea (Mac).

Um dos motivos da riqueza estética de Suely talvez esteja justamente na variedade de fontes de inspiração e de conhecimento. Se, por um lado, completou o Conservatório Lafaiete sob orientação da pianista Letícia Pagano, uma de suas principais incentivadoras no universo artístico, também tem como referências em sua carreira nomes como Antonio Carelli, Percival Tirapelli e José Antonio Van Acker.

Desde 2000, a artista trabalha com pintura acrílica sobre lona e papel artesanal sob orientação de Sergio Fingerman, aprimorando um conceito que lhe é caro: o de que as formas plásticas, próprias do abstracionismo, podem se tornar poéticas. Talvez isso explique por que Suely se sente à vontade ao trabalhar com superfícies rugosas, seja tornando áspero o papel da aquarela ou colocando materiais com textura sobre a lona.

Suely é uma artista de corpo inteiro. Além de criar e comercializar as suas obras, participa como membro da Diretoria do Sindicato dos Artistas Plásticos do Estado de São Paulo (SINAPESP) e do Comitê Nacional Brasileiro da Associação Internacional de Artistas Plásticos – Unesco (AIAP-UNESCO), além de integrar o Conselho Consultivo do Núcleo de Aquarelistas de São Paulo. Esse aspecto acentua a sua profunda ligação com todas as instâncias do ofício da criação.

Cada traço de Suely Cauduro, seja na gravura, na aquarela ou nas mais recentes experimentações sobre papel ou lona, revela uma artista no sentido mais amplo do termo. Isso significa trabalhar as tintas em nome da experimentação e contra qualquer tipo de estagnação técnica.

Seja pintando ou ministrando cursos e oficinas sobre aquarela ou arte terapia, a artista mantém o seu elevado nível de qualidade, sempre pronta a surpreender com novos trabalhos que desafiem a nossa compreensão. Mostra assim como Heráclito foi sábio, pois os caminhos podem ser semelhantes para todos, mas a maneira como cada um os enfrenta é que faz a diferença. Suely Cauduro escolheu a arte e a leva impregnada na alma, como uma tatuagem, que ganha tons cada vez mais vivos quando o processo de criação se concretiza.

 

Oscar D’Ambrosio

Enviar